London, London
Olá, tudo bem?
Quase um diário de viagem. Minha Eurotrip após 24 anos sem pisar na Europa. Gosto de pensar em cada momento como especial. E é. Porque tudo o que nos faz feliz é especial. Mesmo que seja um breve momento.
Quando desci na Estação de Trem Saint Pancras, meu coração acelerou. Havia 24 anos que não visitava Londres. E, na vez anterior, eu tinha desembarcado no aeroporto de Heathrow. Nunca tinha viajado de trem na Europa e era um sonho.
Saí de Amsterdam muito cedo e a viagem foi tão sonolenta que mal aproveitei a paisagem. Que não era lá essas coisas, pelo pouco que vi. Casinhas de beira de estrada e de beira de ferrovia. E o Eurotunel com a sua escuridão submarina.
Olhei para a bilheteria do metrô, perguntei ao guarda como funcionava, e ele explicou que só aceitava cartão de crédito ou débito. A compra não era muito simples. Desisti. O trânsito estava pavoroso e decidi ir caminhando até o hotel, como fiz em Amsterdam. Calculei mal a distância. Era longe. Mas desistir não era uma opção. E lá fui eu arrastando a mala pequena pelas ruas imensas de Londres. Como eram duas avenidas retas até o hotel, não tinha como errar. Confesso que cansei.
Ao chegar ao hotel, tomei um banho relaxante e fui caminhar para esticar as pernas. O cansaço parece que some após um bom banho. Tinha de ver o Hyde Park para ter certeza de que estava em Londres. É o meu ponto de referência afetiva.
Anos atrás, fiquei num hotel elegante em Bayswater, que era só atravessar a movimentada avenida, “road”, para chegar ao Palácio de Kensington. Desta vez, fiquei em Paddington, quase ao lado. Havia um pequeno jardim perto da rua do hotel: Sussex Gardens. Prédios elegantes como em toda a região.
Após dias de chuva fina que quase não deu trégua na Holanda, vi uma Inglaterra com o céu cor de rosa. Foi um carinho que recebi com alegria. A decoração de Natal já estava presente, mas sem o impacto da visão noturna. Como foi bom olhar aquelas ruas de novo.
Quando visitei Londres, em junho de 1998, com meus pais e minha tia, a minha mãe estava com um problema de saúde, uma bactéria intestinal, cansava à toa, enjoava as comidas, não se alimentava direito. É desconfortável você se divertir ou querer caminhar com uma pessoa se sentindo mal e fazendo esforço para acompanhar.
Só eu gostei de Londres. Eles detestaram. Chovia fino, a névoa era constante, estava gelado apesar de ser verão.
Eu queria conhecer os lugares que povoaram a minha imaginação ao longo dos anos. Do casamento real de Diana e Charles a cada passo da Monarquia. Acompanho séries, livros, jornais. Gosto da História do Reino Unido desde os primeiros reis, nem tão chiques e civilizados.
Fomos aos lugares mais típicos de turista. Mas eu queria conhecer a Londres do morador. Aquela coisa de caminhar e descobrir ruas bonitas, comércios sem grife, lugares que tivessem um charme sem ser fabricado para agradar viajante.
Desta vez, estranhei que quase não aceitavam dinheiro. Preferiam cartão de crédito ou de débito. Insisti e fiz as minhas compras com Libras. Uma chatice. Viajei com Euros e esqueci do Brexit. No câmbio das lojas de rua, mesmo as especializadas, os aproveitadores fazem a festa e pagam menos. Muito sem ética.
Os preços estavam equivalentes ao Brasil. Não achei nada estupidamente caro. Muito pelo contrário. Fui na expectativa de pagar caríssimo por qualquer bobagem e até a alimentação estava mais barata do que no Rio de Janeiro. O mesmo aconteceu em Paris. Um croissant maravilhoso por 1 Euro ou 1 Libra. Pouco mais de cinco reais. No Brasil, qualquer croissant de padaria custa o dobro.
Meu filho não quis viajar. E eu querendo que ele visse o que eu via e sentisse o que eu sentia. Viajar sozinha é bom porque a gente precisa de um tempo, um direito ao egoísmo saudável, de cuidar apenas de si. Mas eu quero que ele tenha na memória as viagens que fazemos juntos. E, nessa, ele não estava. Lugares tão especiais. É bom rever lugares. Mas mostrar lugares para outra pessoa é mais gostoso ainda.
Em 1998, havia um ano que Diana tinha morrido. A camareira do hotel, uma simpática portuguesa, contou que, logo após a morte dela, era impossível caminhar próximo a Kensington, devido ao cheiro das flores em decomposição, colocadas pelos fãs de Diana, ao longo das grades, em frente ao Palácio. E que, um ano depois, ainda colocavam flores. A camareira nos acompanhou até a entrada do Palácio e vimos as homenagens. Interessante é que o mesmo não se deu em relação à rainha Elizabeth II. Ela morreu em setembro e eu visitei Londres em novembro. Não havia mais flores ou cartazes por Elizabeth II. Já em Paris, na Pont D’Alma, lá estavam fotos e flores para Diana, 25 anos depois de sua morte trágica no túnel.
Foi uma sensação estranha passear por Londres sem a existência da monarca. Elizabeth II não era visível e acessível aos simples mortais de férias. Mas saber que ela estava no Palácio, ou mesmo em Londres, era diferente de ter Charles como rei. O Reino Unido perdeu muito de seu charme sem a rainha.
Há um jardim, um parque infantil e uma estátua, em homenagem a Diana, em Kensington Gardens. Mas são muito feios. A estátua da princesa, de mãos dadas com crianças, parece qualquer pessoa, menos Diana. E por que não de mãos dadas com seus filhos ou sozinha? Quem decidiu o estilo da homenagem não valorizou Diana. A escondeu num canto de Kensington e numa estátua feia. Como quem diz: “Temos de aturar, então que seja num canto sem muito destaque”.
Londres está repleta de estrangeiros de origem árabe ou africana. Muitos muçulmanos pelas ruas, mulheres de burkas, camelôs estrangeiros vendendo produtos falsificados, restaurantes e hoteis cujos donos são paquistaneses, egípcios, turcos. As quitandas repletas de doces e frutas típicas daqueles países. os bairros próximos a Kensington estão ocupados por imigrantes.
Não tive medo de andar sozinha. Mas evitei a noite. Caminhava tanto durante o dia que à noite queria o sossego do meu quarto de hotel. Eu levava lanche, sucos, e ficava deitada lendo, vendo as notícias da internet, conversando com a minha família pelo vídeo do WhatsApp. Deixei a preguiça tomar conta. Não tinha horário para acordar e nem dormir. Mas evitava ficar até tarde na rua. Escurece por volta de 17h. E há muitos parques com iluminação fraca. Às vezes, para chegar a um ponto turístico é necessário cruzar um parque ou mesmo caminhar junto à cerca. Não é bom arriscar.
Queria ter ido a Windsor. Fica a 50 minutos de trem de Londres. Mas eu tinha reservado poucos dias para Londres e preferi ficar apenas na cidade. Foi muito bom rever os lugares icônicos. Senti muito que meu filho não estivesse junto.
Não sei quando voltarei a Londres. A magia elizabetana terminou. Em compensação, já anseio por voltar a Amsterdam e Paris. O carinho que eu tinha por Londres se transferiu para Paris, que eu tinha implicância. Maluquice de viajante.
É interessante ver Londres pelo aspecto do marketing. Tudo gira em torno da família real. Chega a enjoar. Toda loja com mil canecas e bugigangas com os rostos dos nobres. É um fanatismo, uma idolatria, um excesso de cafonice que não me atraem.
Como será o reinado de Charles III? Convidará o mundo a visitá-lo ou fará com que a gente se desencante dos palácios e das histórias sem sal como ele? Camilla é horrenda. A história dela com Charles é o suco da hipocrisia. As aparições da família são muito ensaiadinhas. Parecem robôs programados para o papel de perfeitinhos. Não há espontaneidade sequer nas crianças. Com Diana, havia a sensação de pessoas de verdade. Havia o glamour que até hoje faz o povo falar nela e querer sempre algo a mais. Com Elizabeth II, havia a História. William perdeu o viço da juventude e parece um senhorzinho. Kate passa a imagem de que mal consegue esperar para ser rainha. Elizabeth II tinha acabado de morrer e Kate já desfilava às gargalhadas. Nem uma lagrimazinha para fingir que não queria a vaga. Nem penso em Harry, tão insuportável e chato. Muito menos na manipuladora e deslumbrada Meghan. Já não os consideram da realeza. Querem ser celebridades ricas americanas. A vulgaridade tomou conta deles. Não há sangue Windsor que resista a tanta fofoca, livro, série, e entrevista expondo a parentada metida a chique. Londres já, já cai no esquecimento como Mônaco pós-Grace. Vira uma cidade bonita, mas sem “a realeza”.
Um beijo, Letícia.