BabyGirl & Nicole Kidman
Olá, tudo bem?
Adoro todos os roteiros em que Nicole Kidman atua. Acompanho a carreira da atriz desde o início, quando ainda era a ruivinha angelical e quase desconhecida, que foi alçada ao estrelato mundial ao unir o seu talento ao romance com o astro Tom Cruise. É inegável que Nicole teria condição de atingir o status que tem com seu trabalho, por mérito próprio. Mas o casamento com o homem lindo, poderoso, excelente ator, e já astro de Hollywood, colocou um outro tipo de holofote sobre ela.
O casamento acabou em meio a polêmicas. Nicole já estava consolidada. Mas se não soubesse gerenciar as suas escolhas e a sua carreira, ela poderia ter sido colocada de lado. Não é mais jovem e nem novidade. E a indústria é cruel. Demi Morre e “A Substância” que o digam. Quantas musas dos anos 80, 90, ainda arrastam multidões aos cinemas ou atraem atenção em séries? Quantas mulheres de 50 conseguem bons roteiros e o protagonismo neles?
Nicole tem o dom, o talento, a inteligência e o poder de escolher o texto, a série, o filme em que vai trabalhar. É privilégio de poucos poder se dar o luxo de escolher trabalho. Algumas atrizes têm visão de impacto e sensibilidade para saberem que o filme será bom. Para elas, para o público, para quem produziu.
Cinema é indústria. Poucos fazem filmes para agradar apenas a si mesmos. Tem de haver algum tipo de retorno. Seja em forma de bilheteria, prêmios, satisfação artística, mensagem a ser enviada ao público, retomada da carreira, buzz na mídia.
Assisti a uma entrevista de Demi Moore na qual ela diz que “Ghost”, o seu filme de maior impacto, foi esculhambado pela crítica. E adorado pelo público. Que, ao ler o roteiro, gostou, mas teve a insegurança e a dúvida de que poderia ser um desastre ou um sucesso. Misturar romance, espírito, drama, comédia, é realmente um risco. Mas deu certo. Teve o mesmo receio com “A Substância“. Artista é inseguro mesmo.
A crítica não é a dona da verdade e nem sempre é imparcial. Há críticos que desejariam escrever os roteiros. E não se conformam com o fato de serem apenas críticos do trabalho alheio. Uma relação de inveja e frustração. Como não conseguem ser roteiristas, por falta de talento ou de padrinhos, viram críticos.
O certo é que “Ghost” é uma delícia de filme e virou cult. Demi alcançou o estrelato com ele. Fez inúmeras escolhas erradas de roteiros nos anos seguintes e se reabilitou com o polêmico “A Substância”. Já escrevi sobre Demi e o filme aqui no blog.
“BabyGirl” é o filme do momento de Nicole Kidman. Ganhou o prêmio de melhor atriz no prestigiado Festival de Veneza, foi indicada ao Globo de Ouro, e esnobada na indicação ao Oscar. Impacto na mídia. Nicole é uma estrela mundial. Outra esnobada que o Oscar deu foi em Angelina Jolie, que está irretocável em “Maria”, sobre a cantora de ópera Maria Callas. Injustiça imensa. Perde a Academia do Oscar, que deixa de ter atrizes maravilhosas na disputa de sua premiação.
O marketing de “BabyGirl” aposta também no TikTok, com a trend em que mulheres entram e saem do cinema, com expressões de antes e depois, ao som de “Father Figure”, música linda do meu crush George Michael.
A turma mais jovem está conhecendo a canção pelo filme. George explicou que a canção é sobre uma história pessoal dele. E tem a ver com o jovem que deixa o lar para trilhar a independência, a vida adulta, e busca em seu relacionamento amoroso não apenas a figura paterna, mas o “replacement”. Que muitas vezes “Father Figure” é colocado como o símbolo do homem inseguro, mas que sair da casa dos pais, é buscar seu lugar como indivíduo, na opinião de George, afeta muito mais as mulheres.
“Father Figure” não se encaixa objetivamente na premissa do filme. É um som sexy, mas para a cena escolhida, haveria músicas mais alinhadas. O boy não é a figura paterna para Nicole. A não ser pelo tom de comando. E prefiro George Michael dançando ao boy do filme.
No filme, Nicole é uma CEO importante, rica, que circula por Nova York, e é insatisfeita com a vida sexual com o marido. Detalhe que o marido é Antonio Banderas, símbolo sexual de tantos filmes. Foi colocado na posição de homem insosso, chatinho, incapaz de satisfazer a mulher. A brincadeira da escalação é interessante. Como quem diz: “Não compre o livro pela capa”. Seria cômodo escalar um ator feio, sem fama de gostoso, mas é Antonio Banderas. Cheio de plástica no rosto, mas ainda lindo. O casal não combina. Não imagino Nicole com Banderas.
O boy é estagiário atrevido, entra na empresa, e logo é apresentado a Nicole. O roteiro tem várias cenas improváveis. Que soam forçadas para o caso acontecer. Você não imagina uma executiva de NY, CEO, a todo momento nos mesmos bares e lugares da empresa que o estagiário. Não haveria condição financeira e muito menos tanta facilidade. Mas é ficção e para dar certo tem de haver liberdade poética.
Nicole conhece o rapaz na rua, quando ele “controla uma cachorra” com um biscoito. Nicole fica impactada e seduzida pelo jovem. É meio óbvio o que a cena sugere. Nicole numa cena quase seguinte pergunta ao estagiário como ele controlou a cachorra. E ele responde: “Com biscoitos”. Ela insiste: “Você sempre tem biscoitos no bolso?” E o estagiário atrevido pergunta: “Você quer um biscoito?” Mas foi ela que perguntou. Ficou sexy? Não. Comparou a CEO a uma cachorra? Sim. Qualquer outro filme deixaria a cena babaca e vulgar. A CEO de NY o afastaria da empresa. Tantos casos de assédio. Ele poderia denunciá-la. Mesmo tendo provocado e se insinuando. Foi risco. Mas no filme ela o beija. A personagem está carente demais. Mas pelo amor de Deus. Disfarça um pouco. Quase pulou no estagiário. A interpretação de Nicole é cheia de olhares, suspiros, gemidos. Não merece Oscar.
O filme é básico. Não é aquela coisa toda. Há cenas de sexo. No limite da exposição. Senão viraria um pornô e Hollywood jamais perdoaria Nicole. Seria o mesmo erro de Demi ao fazer o filme “Strip Tease”, roteiro frágil, chulo, que derrubou a carreira dela. “BabyGirl” é um roteiro comum demais. Apenas inverte a “lógica” dos roteiros em que é sempre o homem poderoso que pega a estagiária. O buzz em cima do filme vem de Nicole, investimentos, marketing, e uma atriz de 50 no comando das cenas. É filme para a autoestima de Nicole.
Nicole não é a cachorra do biscoito na rua. Mas sente desejo em diversas humilhações e submissões. Ela quer ser tratada daquela maneira. O estagiário chega a inverter a situação, como se ela o perseguisse, como se ela o tivesse provocado. E diz algo como: “Eu não quero uma namorada, você é como uma mãe”. Ele dita as regras.
A CEO está visivelmente desequilibrada e é inimaginável que ninguém tivesse percebido na rotina doméstica ou profissional. Quando Nicole chega de uma rave, desgrenhada, depois de uma noite com o boy, e só a filha liberal e compreensiva a vê, é bem forçada.
O boy passa a ideia de psicopata em algumas atitudes e ela se mostra vulnerável. Sem inteligência emocional. A velha máxima de que homem “pensa com o pênis” diante de uma mulher gostosa. No caso, Nicole não usou a mente, nem a lógica. Está sempre à beira de um ataque de nervos. Overacting.
O filme abre com a tela escura e gemidos. É a apresentação do casamento. Ela transa com o marido, mas não se satisfaz. Quando o sexo termina, ela vai para um quartinho e se masturba enquanto assiste a um filme pornô. A CEO não parece nada segura sobre si mesma e suas vontades.
Numa outra cena, Nicole bebe um copo de leite, enviado num bar, pelo estagiário. Quando recebeu o prêmio de melhor atriz no National Board of Review Gala, em Nova York, na mesma semana em que perdeu o Golden Globes, Nicole repetiu o gesto, e foi duramente criticada. O gesto de “beber leite” em público é ligado à supremacia branca. Como Nicole está loira e tem incríveis olhos azuis, desceram a pancada na atriz. Óbvio que não tem relação, mas a patrulha woke, não a poupou. Talvez esse gesto a tenha excluído da indicação ao Oscar.
Nicole conta a Banderas que o trai. Sim, eu uso o nome dos atores para o impacto visual e no imaginário ser maior. Quando o marido descobre a traição, age como um homem comum traído sexualmente e na confiança. Revolta-se. Expulsa a mulher de casa. A filha do casal conta para a mãe que ele vai aceitá-la de volta, que ele se “refugiou na Bíblia”. Um diretor de teatro de NY careta. Não tem preconceito com a filha lésbica. Mas tem posturas conservadoras nas demais cenas. Choca-se com os desejos da mulher. Talvez seja a novidade do filme. Mas numa cena que considero mal pensada e mal desenvolvida, Nicole encontra o boy na piscina da casa dela, mergulha, e, numa salinha, logo após a piscina, o ex-marido entra. E tira satisfação do boy. Coitado do Banderas. Foi mais humilhante do que Nicole, igual cachorra, de quatro, beber outro leite no pires sob ordem do boy. Como o boy chegou à piscina? Qual a necessidade de o marido fazer DR a três com aquele texto ruim? As fantasias sexuais de “BabyGirl” provavelmente serão repetidas mundo afora. Mas por favor, não humilhem os Banderas da vida em cenas tão constrangedoras.
Óbvio que a firma descobre o caso da CEO e ela é chantageada por uma jovem e por um diretor. Porém, adorei que Nicole manda o diretor cafajeste se f* quando ele tenta se aproveitar da situação para ficar com ela. Atrevido, cafajeste e feio. A cena serve para que ela sinta asco da chantagem e do homem. Vale muito mais para a personagem se libertar do que a DR a três.
Harry Dickinson, o ator que interpreta o estagiário, é o boy do momento em Hollywood. Mas está longe de ser um escândalo de homem lindo. É alto, magro, estilo modelo europeu. Já o vi na plateia de um desfile em Paris e numa campanha da Prada. Combina com a marca. É chique. Fará muito sucesso. Já vi outro filme com ele, que realmente recomento: “Triângulo da Tristeza”, de 2022.
Enfim, Nicole é maravilhosa. E salva o filme. Gosto de atrizes que se arriscam e saem do rotineiro. Que desafiam a plateia. Mas “BabyGirl” não é filme para prêmios ou para a estatueta badalada do Oscar. Assista como entretenimento. Não busque algo filosófico, profundo, revolucionário. É cinema. E está na moda.
Qual o final do Banderas no filme? Eu ri. E o personagem riu também. Mas fez igual ao boy.
Para o Oscar, na minha opinião, e sou dona da minha opinião, o melhor filme é “Conclave”, sobre os bastidores da escolha de um papa. Refizeram o Vaticano na famosa Cinecitta, maravilhoso estúdio de Roma, onde Fellini realizou os seus melhores filmes. Os atores estão fantásticos. Para Oscar de melhor atriz, eu votaria em Demi. Seria Angelina por Maria Callas. Como não foi indicada, fico com Demi.
Um beijo, Leticia.